terça-feira, 27 de setembro de 2011

A Guerra dos Calendários em Israel

A Guerra dos Calendários em Israel
 Por Shau'l Bentsion
A Disputa entre Seis Calendários
Uma vez que vimos que o calendário judaico atual está muito longe de ser o calendário bíblico, nos resta analisarmos os demais calendários das seitas judaicas históricas, para verificarmos que calendário é plenamente bíblico em sua essência, e corresponde ao calendário originalmente adotado por Israel.
Uma análise mais próxima da história da disputa pelo poder entre as seitas judaicas revelará que os entraves calêndricos estavam no cerne de muitas dessas disputas. Afinal, deter o controle sobre o calendário significava exercer um domínio sobre toda a vida religiosa do povo – ou pelo menos, da parte do povo que seguisse o grupo em questão.
É por isso que temos nada mais nada menos do que 6 calendários adotados historicamente pelo povo de Israel!
A saber, são os seguintes:
Calendário Samaritano
Calendário Fariseu/Mishnáico
Calendário Essênio/Saduceu
Calendário “Proto-Hillel 2” (*)
Calendário de Hillel 2
Calendário Caraíta
(*) Nome arbitrário atribuído ao período em que o calendário fariseu começou a ser calculado, mas que as regras ainda não eram plenamente adotadas, e que ainda havia alguma observação dos astros.

Sabe-se que pelo menos 3 desses calendários conviveram ao mesmo tempo: O Calendário Samaritano, o Calendário Fariseu/Mishnáico e o Calendário Essênio/Saduceu. Isto indica que cada vez que um grupo ganhava uma determinada proeminência, adotava uma postura revisionista com relação ao calendário, para assegurar sua hegemonia de poder.
Isso pôde ser visto até bem pouco tempo atrás, historicamente falando.
Por exemplo, Shabatai Tsvi, um falso messias que surgiu no século XVII, tentou, segundo a Enciclopédia Judaica: “O primeiro passo em direção à desintegração do Judaísmo tradicional foi à mudança do jejum no décimo dia de Tevet para um dia de festa e júbilo.” Nesse caso em particular, o jejum de Tevet não é uma ordenança bíblica, mas ilustra bem a mentalidade dos líderes de que aquele que controlasse o calendário, controlaria a vida religiosa do povo e, consequentemente, o próprio povo.

Evidentemente que, para nós, o mais importante não são as contendas entre as seitas judaicas, mas sim o calendário bíblico propriamente dito.
Contudo, é importante conhecer a história para entendermos o porquê de termos chegado onde chegamos.
Em breve, veremos que apesar de ser plenamente possível chegarmos a uma conclusão sem qualquer controvérsia acerca do calendário, não é tarefa trivial, e demanda não apenas um esforço de estudarmos cada nuance, como uma grande atenção para as sutilezas do texto bíblico. Como veremos mais adiante, a principal dificuldade está no fato de que a Torá não delineia instruções específicas sobre o calendário, partindo do pressuposto de que o mesmo já fosse familiar aos seus leitores. Veremos também o porquê disso mais adiante.
O importante de enfatizar aqui é que justamente a ausência de tais instruções de forma clara e sistematizada é que permitiu o surgimento dessas diferentes vertentes.

Voltando ao Segundo Templo
Mas antes de adentrarmos na questão dos calendários propriamente ditos, uma pergunta é importantíssima para nós: Que calendário Yeshua seguiu?
Certamente Melech HaMashiach (o Rei Messias) seguiu adequadamente o calendário bíblico.
Na realidade, o NT nos diz algumas coisas acerca da controvérsia dos calendários, mas são informações bastante espaçadas e passíveis de diferentes interpretações. Porém, um fato permanece para nós: Há algum indício histórico de que havia mais de um calendário nos tempos de Yeshua? Tal pergunta se faz relevante porque se não houver qualquer evidência histórica de uma controvérsia nos tempos de Yeshua, isto é, se a controvérsia for posterior a Yeshua, ou muito anterior a Ele, então poderemos concluir com relativa segurança que Yeshua seguia o calendário do sistema religioso do segundo Beit HaMikdash (Templo).
Mas, se a história nos revelar que durante o período do segundo Beit HaMikdash (Templo), havia mais de um calendário vigente, então de fato carece estudarmos os calendários que se apresentam, e analisarmos qual de fato é o calendário bíblico. Para isso, analisemos o principal motivo da disputa calêndrica mais acirrada da história do Judaísmo.

Antíoco Epifânio e a Mudança do Calendário
Em sua obra “New Testament Chronology”, Kenneth F. Doig relata o motivo da principal controvérsia calêndrica, entre fariseus e saduceus/essênios:
“Depois que Alexandre o Grande morreu em 323 AC, seus generais dividiram o império. Ptolomeu tomou o Egito e trouxe a Judéia sob o seu controle. Os descendentes de Seleukos Nikator governaram a Síria, e finalmente obtiveram o controle da Judéia em 198 AC. O governante selêucida Antíoco IV Epifânio estava determinado a helenizar seus territórios, e tornou o Judaísmo ilegal. Logo se seguiu a morte de muitos judeus leais e finalmente a profanação do Templo em 167 AC. Então, Antíoco iniciou o uso do calendário Siro- Macedônio para substituir o calendário do Templo.”
Em Macabim Alef/1 Macabeus 1:44-45, lemos que Antíoco Epifânio não se agradava do serviço religioso judaico:
“Por intermédio de mensageiros, o rei enviou, a Yerushalayim e às cidades de Yehudá, cartas prescrevendo que aceitassem os costumes dos outros povos da terra, suspendessem os holocaustos, os sacrifícios e as libações no Templo, violassem os Shabatot e as festas.”
Já em Macabim Beit/2 Macabeus 6:6-7, encontramos um relato bastante curioso:
“Não se permitia mais a observância do Shabat, a celebração das antigas festas, nem mesmo confessa-se judeu. Em cada mês, no dia natalício do rei, realizava-se um sacrifício; os judeus eram odiosamente forçados a tomar parte no banquete ritual e, por ocasião das festas em honra de Dionísio, deviam forçosamente acompanhar o cortejo de Baco, coroados com hera.”

Aqui vemos que o principal motivo para mudança do calendário era a celebração do aniversário, ou melhor dizendo, “mensário”, de Antíoco Epifânio.
Sobre este fato, James VanderKam comenta em sua obra “Calendars in the Dead Sea Scrolls: Measuring Time”:
De interesse particular aqui é a menção do “aniversário” real. Esta prática que é mais do que atestada nas seitas reais helenistas ocorriam em uma data específica a cada mês – a data na qual o rei nascera – e presumivelmente servia uma função prática de encorajar a lealdade popular ao rei divino. Mas se o aniversário do rei deveria ser observado na data correta, era preciso seguir o calendário adequado. No caso do império selêucida, aquele calendário era o arranjo luni-solar. Verifica-se a partir deste versículo que os judeus foram obrigados a celebrar um feriado que era datado segundo o calendário selêucida.
A natureza religiosa do evento emerge da referência a participarem nos sacrifícios que eram realizados na ocasião. 1 Mac. 1:45 confirma que a política real envolvia profanar os Shabatot e festas, isto é, aparentemente aos judeus não era permitido celebrar seus próprios feriados, mas foram forçados a celebrar feriados selêucidas. Ou, como 2 Mac. 6:6 diz: ‘Não se permitia mais a observância do Shabat, a celebração das antigas festas’.
Que a celebração mensal do “aniversário” do rei era comemorada no Templo deriva de 1 Mac.. 1:59, que aparenta falar do mesmo evento mencionado em 2 Mac. 6:7. “E, no dia vinte e cinco do mês, sacrificavam no altar, que sobressaía ao altar do Templo”. O décimo quinto aparentemente era a data do aniversário real, e nele os sacrifícios eram apresentados no altar no Templo em Jerusalém. Isto é, o calendário selêucida agora regulava festas e sacrifícios no santuário do Senhor.

Na coletânea de livros da obra “Tempo Final”, comentamos a respeito do fato de que Antíoco Epifânio era visto como sombra profética da iniqüidade que haveria de vir sobre Israel. Vimos que, a exemplo do que ocorrerá no fim dos tempos, Antíoco Epifânio colocou sobre o Beit HaMikdash (Templo) uma abominação desoladora. Vimos que ele também tentou mudar/abolir a Torá.
Não é surpresa alguma que, tal qual o falso messias descrito em Dani’el 7:25, Antíoco Epifânio também mudou “os tempos do El-Eliyon.”

A Origem da Disputa
Como nosso objetivo aqui é simplesmente entender a disputa calêndrica, o que descreveremos a seguir acerca das acirradas disputas ocorridas entre as classes dominantes do povo de Israel será bastante abreviado, visto que o mais importante é apenas contextualizar a situação.
Em 164 AC, Yehudá Macabi se levantou contra o império selêucida (greco-sírio) e conseguiu a independência de Israel. Em tese, isso significaria que o serviço a YHWH no Beit HaMikdash (Templo) voltaria normalmente a ser praticado, sem qualquer controvérsia, até os tempos da destruição de Yerushalayim (Jerusalém), certo?
Infelizmente, não foi bem assim. Kenneth F. Doig (ibid) assim narra os eventos decorridos:
O trauma das perseguições judaicas e a “abominação desoladora” no Templo fez com que os judeus novamente examinassem suas crenças e práticas. Onde é que haviam errado para trazer a ira do Eterno sobre eles? O debate religioso dividiu os judeus. Logo após esses eventos, Josefo relata que havia três seitas dentre os judeus, com diferentes opiniões acerca da ação humana. (Antiguidades 13:5:9). A profanação síria do Templo cristalizou as três seitas naquele tempo.

De fato, após a morte dos primeiros líderes da revolta dos Macabeus, cresceu o interesse entre diferentes segmentos judaicos em dominarem a vida político-religiosa do povo. Como já vimos anteriormente, as três correntes judaicas principais da época eram os essênios, antigos sacerdotes zadokitas que haviam sido exilados durante a dominação selêucida; os saduceus, sacerdotes hasmoneus que tentaram se estabelecer no poder, alegando ascendência zadokita, e os fariseus, movimento mais laico de rabinos e mestres que tinha forte apelo entre a população, desde que as sinagogas se estabeleceram na primeira diáspora babilônia.
À época, o que os fariseus fizeram não é muito diferente do que, muitos séculos depois, passaram a acusar os judeus reformistas. O movimento da reforma judaica é criticado por ortodoxos por ser uma tentativa de tornar o Judaísmo menos diferente das culturas ocidentais modernas, o que teria, entre outros motivos, a missão de suavizar o crescente anti-semitismo e abandono da identidade judaica. De volta à época que emergiu logo após a revolta dos Macabeus, os fariseus propuseram que a dificuldade poderia ser amenizada com o resgate de elementos da cultura siríaco-babilônia, como forma de suavizar as diferenças.
Uma dessas formas era justamente o uso do calendário babilônio, que era exatamente a base do calendário babilônio, que era praticamente idêntico ao calendário selêucida instituído por Antíoco Epifânio. Sobre isso, Kenneth F. Doig (ibid) narra:
O calendário siromacedônio era supostamente equivalente ao calendário babilônio desde o tempo de Alexandre até o primeiro século. A seqüência de moedas de 15/16 DC da Selêucia no Tigre se encaixa com a correlação anterior derivada de Ptolomeu… As moedas são datadas com o mês e o ano do reinado de Artabano II e dos anos 326 e 327 da Era Selêucida… As moedas demonstram que em 15 DC, Atermisios era igual a Nissanu, dos babilônios.

Essa mudança pode parecer sem sentido em nossa cultura, porém era absolutamente crucial na época. Afinal, a religião era o principal elemento da identidade de um povo, e um calendário de eventos religiosos governava a religião. Se o calendário fosse semelhante, haveria menos razão para uma intolerância à religião do povo dominado, por parte de seu dominador. E aquele calendário era adotado em boa parte do mundo conhecido.
Para justificar suas práticas, introduzir novos elementos sincréticos, e assegurar o seu calendário, os fariseus se utilizaram da suposta Torá Oral (para maiores informações sobre esse tema, vide nossa palestra sobre o NT e a Lei).
Mikhael Bauer, em seu artigo “The Jubilee Calendar”, assim comenta a posição dos fariseus:
“Aparentemente, a justificativa REAL da inspiração da Torá Oral era a de que ela ensinava o calendário solar-lunar [N. do T: ie. o calendário fariseu]. Aparentemente, a justificativa REAL para o calendário lunar-solar é o fato dele ser definido na Torá Oral. Quando essas duas justificativas são tomadas juntas, elas não apresentam muita segurança em qualquer uma.”

Evidentemente, a proposta foi tomada por saduceus e essênios como uma verdadeira abominação. O que se sucedeu foi uma alternância do calendário à época do Segundo Beit HaMikdash (Templo) devida exatamente à alternância entre fariseus e saduceus no poder.

Entre Fariseus e Saduceus
Durante o período hasmoneu, os essênios se distanciaram da vida político-religiosa ligada ao Beit HaMikdash (Templo), após terem sido banidos do poder. Segundo relata Josefo, os essênios gozavam de acesso ao Beit HaMikdash, mas realizavam seus rituais à parte dos demais, alguns optando inclusive por deixar completamente o convívio do Beit HaMikdash.
Dessa forma, o poder se concentrou entre as duas facções mais politizadas: os saduceus e os fariseus, que alternavam no poder. Os saduceus representando a aristocracia dos sacerdotes hasmoneus, e os fariseus representando um movimento de classe mais popular.
O controle da vida religiosa no Beit HaMikdash (Templo) alternava entre momentos de predominância entre ambas as partes, e de equilíbrio entre elas.

Por exemplo, durante o período de Alexandre Janeu (governante hasmoneu), os fariseus foram brutalmente perseguidos, e quase levados à total extinção.
Naquela época, prevalecia sobre o governo do Beit HaMikdash o entendimento dos saduceus.
Já na época da rainha Salomé Alexandra, os fariseus passaram de classe perseguida a classe dominante. A rixa entre as duas facções político-religiosas permaneceu acirrada até que Roma dominou a região, e estabeleceu o equilíbrio de forças.

Durante a época da dominação romana, saduceus e fariseus gozavam de uma posição moderadamente equilibrada, embora na realidade, ambos fossem forçados a servir aos interesses romanos.
Fato é que no primeiro século, na época em que Yeshua viveu, havia uma coexistência entre ambas as facções, e os historiadores sugerem que ambos os calendários, o calendário bíblico original, e o novo calendário proposto pelos fariseus, coexistisse de alguma forma. Há três possibilidades levantadas pelos historiadores:
A de que ambos os calendários estivessem vigentes no Beit HaMikdash (Templo) durante a época, dividindo o povo segundo sua preferência;
A de que o calendário dependesse da parte que, no momento, detivesse alguma vantagem política (como, por exemplo, o Cohen HaGadol/sumo sacerdote da ocasião);
A de que os saduceus detivessem o controle sobre o calendário do Beit HaMikdash (Templo), porém aos fariseus também fosse permitido que mantivessem suas festividades.
Das três hipóteses, a primeira e a segunda são consideradas as mais prováveis, e é possível que houvesse algum tipo de interseção entre elas.
Provavelmente, saduceus e fariseus teriam algum tipo de acordo para poderem manter suas práticas religiosas.

Evidências Históricas
De nada adianta explicitar a história acima se não houver fontes históricas que confirmam a existência de dois calendários à época do Segundo Beit HaMikdash (Templo). Vamos a elas, portanto:

1) O Testemunho da Mishná
O primeiro e mais explícito testemunho da controvérsia calêndrica à época do Segundo Beit HaMikdash (Templo) vem da próprio Mishná.
A Mishná relata um conflito grande entre os fariseus e os boetusianos (nome dado aos saduceus devido a Boetus, um dos fundadores da seita) acerca das datas de Yom HaBikurim (Primícias) e Shavu’ot (Pentecostes).
E narra também que supostamente os saduceus faziam de tudo para atrapalhar a proclamação da “lua nova”. Evidentemente que, a partir daí, é inevitável concluir que fariseus e saduceus seguiam calendários diferentes.
Sobre essa controvérsia, a Enciclopédia Judaica narra:
A Mishná, bem como a Baraita, menciona os boetusianos se opondo aos fariseus e dizendo que o mover do molho na época de Pessach não deveria ser oferecido no segundo dia da festa, mas no dia depois do Shabat de fato da festa da semana e, semelhantemente, que Shavuot, que vem sete semanas e um dia depois, deveria ser celebrada após o Shabat (Men. 10:3; compare também com Hag. 2:4). Em outra passagem, é narrado que os boetusianos contratavam falsas testemunhas para desviar os fariseus em seus cálculos da lua nova (Tosef., R. H. 1:15; Bab. ib. 22b; Yer. ib. 2:57d, abaixo, compare Geiger, ‘Urschrift’, pp. 137, 138).

O rabino Yissocher Frand, em seu artigo “De Volta aos Costumes dos Fariseus e dos Saduceus”, confirma a tese de Bauer de que a origem dessa diferença estava baseada numa “Torá Oral” que supostamente regularia o calendário dos fariseus. Sobre o conflito entre ambos, ele relata:
A interpretação rabínica, baseada na tradição da Lei Oral, era de que a ‘manhã após o dia de repouso’ significava o dia após Pessach, a saber o 16º de Nissan. É baseado nessa tradição que nossa prática é de começar a contagem do o Omer no segundo dia de Pessach.
Os tsedukim [saduceus] eram literalistas que não acreditavam na Lei Oral, e interpretavam ‘manhã após o Shabat’ como significando domingo. Assim, o domingo de Pessach seria o primeiro dia da contagem do Omer, e a festa de Shavuot sempre seria no domingo, sete semanas depois.

Na realidade, o rabino Frand erra apenas em um detalhe: O Talmud não nos diz após qual Shabat os saduceus (assim como os essênios) contavam o Omer. A idéia de que seria o Shabat dentro de Chag HaMatsot (da festa de pães ázimos) já é uma interpretação que se faz dessa narrativa, e não condiz com a realidade dos fatos. Veremos mais adiante que os achados do Mar Morto revelam (e de fato a Torá dá a entender) que a contagem do Omer por parte dos saduceus e dos essênios era feita a partir do Shabat imediatamente após Chag HaMatsot.
Mas, o que importa aqui é enfatizar o ponto de conflito calêndrico entre fariseus e saduceus à época do Segundo Beit HaMikdash (Templo).

2) O Testemunho dos Manuscritos do Mar Morto
Existe uma passagem extremamente interessante no comentário essênio do Sefer Havakuk (Habacuque) que também nos revela o quão sangrento foi o conflito calêndrico:
Ai daquele que dá de beber ao seu companheiro! Ai de ti, que adiciona à bebida o teu furor, e o embebedas para ver a sua nudez! [Hab. 2:15]
Isto se refere ao Cohen HaRasha [Sacerdote Maligno] que perseguiu o Moreh Tsedek [Instrutor da Justiça] para destruí-lo no calor de sua ira no seu lugar de exílio. No tempo apontado para o repouso do Yom Kipur, ele lhes apareceu para lhes destruir, e trazê-los à ruína no dia de jejum, no Shabat dedicado ao seu descanso.

Aqui temos uma evidência interessante. Um Cohen HaGadol (sumo sacerdote) ilegítimo teria perseguido os essênios durante o Yom Kipur.
Certamente que isso só seria possível se o Cohen HaGadol em questão seguisse o calendário farisaico/mishnáico, pois certamente não se envolveria em um ato de guerra civil como esse em um dia tão sagrado como o Yom Kipur!
VanderKam (ibid) comenta, acerca deste episódio (os comentários entre colchetes são esclarecimentos, e não fazem parte da citação:
O Instrutor teria advogado o calendário tradicional de 364-dias [N. do T: esse calendário será explicado mais adiante], o qual de fato demonstra ter um pedigree mais antigo, conforme demonstrado pelo Livro Astronômico [N. do T: um fragmento do Mar Morto]. Pode ser que um sacerdote conservador como o
Instrutor, uma vez que suas poderosas alegações acerca de si próprio e de sua posição [ie. de ser o sumo sacerdote legítimo] conforme expressadas nas Hodayot nos fazem entender que ele uma vez deteve um alto ranking, apesar de agora mantê-lo somente em sua comunidade, tentou reintroduzir o calendário de 364-dias no serviço do Templo depois que a ameaça selêucida imediata havia sido removida.

3) O Testemunho de Flavio Josefo
Embora não tão explícito quanto os demais, o testemunho de Flavio Josefo também não pode ser ignorado. Josefo relata acerca dos essênios:
Eles não oferecem sacrifícios [ie. através do Cohen HaGadol “oficial”] porque eles têm aspirações próprias que são mais puras; razão pela qual eles se excluem da ala comum do Templo, mas oferecem seus sacrifícios eles próprios.
Evidentemente que a oferta solitária dos essênios, isto é, fora do sistema religioso corrompido do Segundo Beit HaMikdash (Templo) tinha em conta não apenas a ilegitimidade do sacerdócio hasmoneu imposto, como também em razão das questões calêndricas.

Conclusão
Fica bem evidente, através de fatos históricos, que a época do Segundo Beit HaMikdash (Templo) em Israel viu 2 calendários competindo entre si, espelhando a disputa político-religiosa entre fariseus e saduceus. Isso demonstra que a questão é um pouco mais complexa, e não há como simplesmente olharmos para o NT e dizermos: “Yeshua seguia o calendário do Beit HaMikdash [Templo]” uma vez que não havia apenas um calendário em questão. É preciso irmos mais profundamente na análise de cada calendário, para determinarmos o calendário original.
Encerramos esta parte do estudo, que demonstrou a evolução histórica do calendário e as motivações políticas da controvérsia, com uma pequena tabela que demonstra um padrão de comportamento, e a fonte das alterações nos tempos apontados:
Mudança
Alterações
Personagem Catalisador
Império
Calendário Sacerdotal
Adoção do modelo do calendário babilônio
Antíoco Epifânio
Selêucida (Greco-Sírio)
Calendário Farisaico
Costumes inventados, transformados em leis


Calendário Farisaico
Inserção de novos elementos da astronomia babilônia
Constantino
Romano
Calendário de Hillel 2
Novos costumes transformados em leis






Evidentemente que toda história é passível de interpretação. Os fariseus até hoje mantêm que o seu calendário é o calendário bíblico original, e que foram os saduceus/essênios quem introduziram mudanças.
É por isso que, para confirmar os fatos aqui apresentados, faremos na próxima parte do nosso estudo uma análise dos requisitos bíblicos do calendário, bem como das origens de cada calendário.

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